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VIAGEMCRÔNICA

a gente nunca para de viajar

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Gilberto Gil

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Crônicas sobre uma viagem que só termina no último suspiro.

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Tudo Sobre Barcelona

Atualizado: 9 de abr. de 2019


"No mais, as ramblas do planeta"

A Feria de San Telmo em Buenos Aires é uma das feiras urbanas dominicais mais famosas e tradicionais da cidade. Ruas lotadas, comerciantes vendendo de tudo, artistas cantando, caricaturistas exagerando à vontade e onipresentes Mafaldas. Eu que não sou muito consumista saí de lá com uma coisinha e outra. Ahh os objetos…


Alegria instantânea foi encontrar uma loja que tinha todo tipo de poster de filmes. Comecei dedilhando alguns na seção de tamanho pequeno-médio-para-mais (os cartazes eram organizados por tamanho, mas sou eu quem deu a classificação de pequeno-médio-para-mais pois havia uma infinidade de tamanhos diferentes e o dono na loja não estava disposto a perder tempo com essas organizações). Até que grita em vermelhidão emotiva o primeiro Almodóvar. E depois mais outro e mais um. O consumista sentimental se vira pro dono da loja e diz que vai levar todos os Almodóvares daquele tamanho. No segundo seguinte o consumista realista se dá conta do que disse e começa a rezar com sotaque espanhol para que não haja todos, afinal. Tem 8. Ufa! “Não, senhor! Não discuta comigo! A Gaiola das Loucas não é do Almodóvar!”


De volta ao meu aconchego brasiliense, estabeleci a meta de assistir todos os filmes do Almodóvar em ordem cronológica no decorrer do ano. Seria melhor estabelecer metas como mudar de emprego, investir uma grana seriamente, passar em um concurso? Não vou responder.


Um dos motivos de o Almodóvar ser meu diretor favorito é sua criação de personagens díspares e múltiplos, diferentes em seu modo de ver e viver suas estradas. Porém, todos costurados com 2 linhas inseparáveis enfiadas na mesma agulha: o desejo e a Espanha.


Se Madri é a personagem almodovariana que o manchego mais filmou, outras cidades espanholas desempenharam engenhosamente o papel de melhor amiga da (anti)heroína. Seja a criminosa Valência em Má Educação, a traumática Córdoba em Fale Com Ela, ou a solitária Ilha de Lanzarote em Abraços Partidos, todas mereciam o prêmio de melhor atriz-cidade coadjuvante.


Porém, há uma cidade que não poderia ganhar esse prêmio. Não por falta de talento, já que desse defeito a estrela não padece. Ao contrário, encanta a todos os turistespectadores que pagam o ingresso para uma história bem arquitetada. Em Tudo Sobre Minha Mãe, é Madri a coadjuvante que - mesmo roubando a cena no começo - afasta-se para que o close-up seja todo preparado para fazer brilhar a estrela principal: Barcelona.


É na capital da Catalunha aonde Manuela vai para reencontrar tudo sobre ela e seu passado, e aonde eu fui para passar meus últimos dias de viagem pela Espanha. Para mim, Barcelona é, primeiramente, sinônimo de 2 impactos: Tudo Sobre Minha Mãe e Vaca Profana. Mas vamos nos concentrar no Cinema Mundo hoje.


No filme, conhecemos a travesti Agrado, uma das melhores personagens secundárias inventadas por Almodóvar. Assim que a Manuela chega em Barcelona, encontra sua grande amiga de juventude e vai passar uns dias na casa dela. Da janela do apartamento da Agrado vê-se um dos tesouros mais brilhantes do modernismo catalão - e não foi traçado por Gaudí, mas por Lluís Domènech i Montaner.


O Palácio da Música Catalã é uma casa de espetáculos de um assombro indescritível. Desde sua entrada até seu magnífico auditório principal, resume bem o que foram os anos dourados da moderna Barcelona. Aliás, não resume. Pois se tem algo que aquele manjar recheado de detalhes sem fim não consegue fazer é resumir. O Palácio fala, fala, fala e ainda fica muito por dizer. E você quer ouvir, ouvir, ouvir…


Vou me limitar (que pecado!) às colunas da varanda do piso superior. Um corredor de colunas enfileiradas em pares, ornamentadas com mosaicos coloridos desenhando flores e descartando um capitel clássico para trazer à luz aqueles que se desabrocharão em buquês sem noivas. São essas muito lindas colunas que Manuela ignora enquanto pendura sua roupa recém lavada, consequência metafórica de seus pensamentos alijados da beleza da natureza artificial criada pelos homens, mas fixados em fúnebres flores murchas que precisam ser renovadas pela memória.


De sua varanda, Agrado pode ver o movimento do Palácio todos os dias enquanto toma seu café. Ou todas as madrugadas enquanto toma uma taça de vinho espumante depois de uma noite de trabalho. Sendo assim, não duvido que na verdade foi Montserrat Caballé quem observou Agrado, no intervalo de um solo e outro. “Ei! Montserrat, bonita, sabe porque me chamo Agrado? Porque a minha vida inteira só pretendi tornar agradável a vida dos outros”. “De verdade? Pois estive fadada a ser montanhosa, elevando-me ao tom mais alto, divina dadivosa, e acredito que também tornei a vida de algumas pessoas mais agradável”.


De sua janela, Agrado vê o espetáculo do Palácio da Música Catalã.

Daqui vemos o espetáculo da vida de Agrado.

Eu pude apenas imaginar em qual daqueles balcões morava Agrado. Se é que ainda moraria ali. A imaginação ajuda a fazer uma viagem agradável. Como diria a agradável, “ficamos mais autênticos quanto mais nos parecemos com o que sonhamos que somos”. Despedi-me das janelas e parti para a próxima sessão. Cada canto de Barcelona é um filme.







 
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