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VIAGEMCRÔNICA

a gente nunca para de viajar

o melhor lugar do mundo é
aqui e agora

Gilberto Gil

peru - costas vale sagrado.jpg

Crônicas sobre uma viagem que só termina no último suspiro.

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Uma escapada os dois

"Una giornata al mare tanto per noi morire nelle ombre di un sogno"


Depois do trabalho - nos veríamos depois que ele saísse do trabalho. 12 km de terra até lá. 4 horas para as horas livres. Terra e tempo no meio do ar. De La Paloma à La Pedrera, pomba de pedra num bater de asas pesado contra o vento austral que está a seu favor. Finalmente pousados na areia começamos a plantar a árvore frutífera à beira do mar e ao limite do fim do sol no Uruguai. Cada palavra - velha na boca de um e novidade para o desconhecido - fazia seu papel de gota que rega a planta vagarosamente. Cada pergunta sobre o passado, 50 gotas. Sobre o futuro, 70. Sobre paixão, litros. Sob o céu cinzento, bordejando a água fria e afundando o pé na areia - mas só um pouco, mantendo-nos leves apesar do peso do desejo crescer como redemoinho - chegamos ao barco. Fixo como uma baleia de ferro encalhada, um barco cravado na praia que era sua. Só a metade visível, mostrava por cima da areia apenas uma parte de sua estrutura desenhada pelo tempo e pelo vento artista. Vento passageiro que chegava, tocava um pedaço do monumento e partia, vento viajante. Por fora se via apenas um pouco, como em nós. E por baixo de toda aquela areia macia de grãos cortantes? No fundo havia um beijo escondido. O mais profundo pois tinha ares de ventania do litoral, apesar de ser o primeiro. Ares de ser o que era. Um beijo ítalo-brasileiro numa praia do Uruguai ao lado de um barco naufragado sob uma tarde cadente, gris e fria. Uma fotografia.


E fugimos pois só quem é livre segue as estrelas até cair como uma delas. Valizas com seu chão de areia e casas esparsas e distantes umas das outras, cada casa uma ilha, nossa ilha de exílio onde seríamos heróis apenas por um dia. Descontrolávamos os passos no escuro bucólico, consternados abaixo das constelações, mais brancas que nossas escleras somente as estrelas. E cantamos nossas línguas. Paolo e Rita. Mas quem brilhava era o público. As estrelas piscavam aplaudindo os dois amadores. O que amam? Suas línguas? Unidas, também eram um estribilho. A Via Láctea viu aquele beijo gemido e seguiu girando. Pensando bem, quem girou foi a gente. Que é gente de verdade, não anjos, que ama de verdade sem nem saber de nada. Outra fotografia.


E despertamos desesperados com muito sol e pouco tempo. Sempre ele, o chefe, o dono, a bússola, os ponteiros da realidade. Há muito trabalho pela frente, o esperando. Mas agora há dunas para subir. Áridos caminhos árduos, como de costume. Quilômetros de areia cálida em altas dunas fulvas que terminam em imensas rochas escaláveis. Terminam, não. Essa é a metade de um caminho. Todavia, paramos aí na metade, não avançamos mais. Como meio barco naufragado. Já no topo das rochas a música dizia quem tem consciência para ter coragem. Provavelmente tínhamos isto pelas metades também. Tínhamos o pedaço da metade um do outro, como uma lua minguando. Sabíamos que em breve o breu abraçaria o já pouco desenho do outro, como a lua que não conseguimos ver na noite anterior. Uma fotografia, desta vez real - não apenas uma imagem onírica de um sonhador. Retrato analógico feito pelos dois viajantes, cada um na sua vez olhou pela lente e disparou em busca da luz. Uma sobreposição que une o separado numa surpresa futurística. Uma dupla fotografia de um tempo.


E o trabalho exigiu um adeus e um abraço partido. E a distância muito larga não regaria nossa árvore - colheita de fruto verde. Planta de casa de viajante morre seca de saudade. Adeus, eu tive tempo para os mil fins. Aquele pôr do sol fazia minha sombra crescer e avançar até o mar. Sentado sozinho na praia, o que era escuro alcançou a espuma branca do final das ondas. Eu seria capaz de me afogar mesmo gigante de tanta memória? De tanta liberdade me assombrei com tanto mar nos olhos. Havia por perto um posto de salva-vidas, vazio e ninguém. Encarei um pouco de fim de sol refletido no vermelho alerta da madeira. Luz insuficiente para secar o molhado. Mas é ainda assim um grão dourado de vida. E se é vida, dá para respirar. Uma fotografia:




 


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